No dia que conheci o Jacques Cheuiche, dentro da padaria, ele olhou pra mim e disse "o cinema nunca vai deixar a gente rico ". Eu respondi dizendo que era isso então, por que é a única coisa que sabia fazer era filmar. E rimos.
Não era só filmar que eu sabia. Eu faço outras coisas também.
CINEMA É TUDO QUE SE ACREDITA SER CINEMA, CINEMA É UM ESTADO.
<AS PESSOAS TEM MEDO DA CÂMERA, COM RAZAO>
PRA SEMPRE QUE FICA...
Fábio Bardella, eu, sou brasileiro e trato isso como qualificação. O Brasil me ensinou muito e se tornou um dos sentidos da vida. O Brasil é grande e merece ternura e coragem. Eu acho foda ser brasileiro. Antes de tentar fazer algum sentido, é importante dizer que eu não escolhi fazer isso da vida. Ao longo de duas décadas de estrada, a maior habilidade que desenvolvi foi a leitura de ambientes e o trato com pessoas. Tenho uma carreira no cinema, quase duas décadas, isso foi o que passei a fazer de forma profissional, mas nunca me achei bom o suficiente, porque parecia que não era pra mim. Mas depois eu saquei umas coisas e passei a achar bom o que eu fazia, porque era eu que fazia, e sempre seria de um jeito diferente. E isso passou a me confortar. Mas antes de pegar na câmera, passei por alguns lugares da produção, que é a área formadora. Produção é faculdade de vida. Fazer cinema no Brasil é crazy. E nunca foi só cinema, foi tudo que se precisava filmar. TOP TRENDS, a primeira, maior e impagável: as viagens, sorte, viajei muito filmando e isso me ensinou muito sobre lugares e como entrar e sair deles, como filmar o que se tinha que filmar. Respeito... E nessa desenvolvi a habilidade de chegar, de entrar pela porta que for, e ter a segurança de comunicar com qualquer pessoa, sem distinção, porque isso não existe, porra!
Acho foda o tanto de porta que entrei e o tanto de situação imprevisível que já filmei. O aleatório é formador. Mas as coisas continuam a surpreender mesmo com a repetição, porque nada se repete igual, às vezes parecido, às vezes parece que foi a primeira vez... Na hora que estou filmando, é um momento que me concentro real. Ainda. E isso é sagrado. Eu me mantive durante a maioria destes anos na fotografia, na direção de fotografia. Já fiz de tudo. Se neguei algum job, não lembro, porque tinha medo e precisava provar para minha família que era possível trabalhar com cinema e que era possível me bancar em São Paulo. Meus pais não são artistas. Fui migrando para a direção porque uma coisa não impede a outra. Aquela habilidade com pessoas, que aprendi, passei a por ela full na direção. Set é fazer todo mundo acreditar naquele sonho, que é o REC, ou pelo menos que eu acredite. Já fui sem acreditar também, porque às vezes a gente conta com o destino ou o acaso. Dirigindo, descobri coisas, tombos e milagres, dias de luta, dias de glória. É uma dança o set.
Fazer filme é um absurdo, você vai embora pra casa sem saber o resultado final. Ninguém sabe. Mas a gente faz. Talvez seja por isso. Todo mundo faz o filme junto, de alguma forma. O filme é por direito de todo mundo que, de qualquer forma que seja, participou. Até o espectador pode ter o filme. Aquilo só é o que é porque você tem a responsa de fazer aquelas pessoas criarem algo que tem algum sentido, mesmo que não tenha. Aí eu entro numa segunda coisa, que trago como progresso. Eu sofria muito para fazer qualquer coisa, porque sempre encontrava a porta do infinito de possibilidades. Onde vai a câmera? E agora, DJ? Podia ser o que é bom, mas passei a aceitar as decisões e aceitar o filme possível. Dirigir cena ou fazer a direção de fotografia é bom, é pressão, dá um frio na barriga, e a equipe está lá, pronta, dentro. Nem sempre. Quase sempre. O maior trabalho é você dizer sim ou não. E é a coisa mais difícil. É um absurdo, porque a câmera pode ir em qualquer lugar, e pode enquadrar de vários jeitos, por isso a gente estuda antes, né? E pensa, planeja exatamente, mas na hora tudo muda. Então é isso, eu estou aprendendo a desistir do que estava planejado, porque não era a vibe. Eu aprendi nessa jornada que a gente sempre precisa de um plano B, ou agir rápido. Meus últimos trabalhos grandes tinham essa pegada, muitos sets por dia e entregas de qualidade. Não quero mais, eu acho uma merda a condição de trabalho, isso sempre me deu muita ansiedade, então queria trocar essa condição de freelancer. Eu queria ganhar uma grana na real, e render, e só ficar fazendo cinema do meu jeito. Eu descobri meu jeito, eu tô apegado ao home video, smartphone, formas de filmar que não sejam a busca da imagem perfeita, eu acredito que a imagem comunica por outras vias. Eu tô buscando outras formas onde o roteiro e a perfeição não são necessários. É tudo cinema, se tratado como tal. Eu sei fazer imagem perfeita, mas não sou eu. Alegria é quando começam a te chamar pela sua pegada, aí é legal, é lindo quando você ganha dinheiro pra guardar aquilo em forma de vídeo. No Brasil segui esses anos aí, foi louco, tirei onda, me achei o cara, me achei um merda, senti saudade. Agora tô achando que preciso me expressar de outras formas. Acho que o audiovisual tá me sugando muito, eu não consigo mais voltar pro hotel e ficar de boa, eu quero explodir sempre, porque a expansão artística é um caminho sem volta, e confesso que tenho medo de me perder. Também descobri uma dor incurável, que pode ser pior que sofrer de amor, que é perder um cartão, perder um HD, perder um take, é sem volta, nunca vai ser o que foi, nunca será. A coisa mais amarga é regravar. Triste. Tem uma força estranha também que ajuda na hora da magia lá; Eu, como qualquer ser humano, não nasci pronto, mas fui aprendendo a lidar com o "vai dar certo", e… corta. Fim de diária. Eu senti o que é isso. É satisfação total quando corta e tava todo mundo junto, e todo mundo achou foda. Vale a pena essa porra às vezes, eu sempre tentei fazer valer a pena, então criei uma das minhas filosofias, que é filmar tudo como se fosse cinema, qualquer situação em que eu abro câmera é cinema e é sagrado. Isso foi me levando pra lugares maiores e maiores. Passei a duvidar de coisas grandes também, porque eu sou muito ansioso, e às vezes eu não consigo me guardar pro amanhã, eu vivo muito hojes eternos, e quero parar com isso, não sei como fazer, mas isso é outro papo. Essa é minha bio e portfólio.